segunda-feira, 27 de setembro de 2010

AS VÁRIAS FOMES DA MARINA (por José Ribamar Bessa Freire)

31/01/2010 - Diário do Amazonas
Fonte/direitos autorais: http://www.taquiprati.com.br/home/apresenta-cronica.php?cronica=cronica31-01-2010

“Ai, meu Deus! / O que foi que aconteceu / com a música popular brasileira”?

Há pouco, Caetano Veloso descartou do seu horizonte eleitoral o presidente Lula da Silva, justificando: “Lula é analfabeto”. Por isso, o cantor baiano aderiu à candidatura da senadora Marina da Silva, que tem diploma universitário. Agora, vem a roqueira Rita Lee dizendo que nem assim vota em Marina para presidente, “porque ela tem cara de quem está com fome”. Os Silva não têm saída: se correr o Caetano pega, se ficar a Rita come.

Tais declarações são espantosas, porque foram feitas não por pistoleiros truculentos, mas por dois artistas refinados, sensíveis e contestadores, cujas músicas nos embalam e nos ajudam a compreender a aventura da existência humana. Num país dominado durante cinco séculos por bacharéis cevados, roliços e enxudiosos, eles naturalizaram o canudo de papel e a banha como requisitos indispensáveis ao exercício de governar, para o qual os Silva, por serem iletrados e subnutridos, estariam despreparados.

Caetano e Rita Lee foram levianos, deselegantes e preconceituosos. Ofenderam o povo brasileiro, que abriga, afinal, uma multidão de silvas famélicos e desescolarizados. De um lado, reforçam a idéia burra e cartorial de que o saber só existe se for sacramentado pela escola e que tal saber é condição sine qua non para o exercício do poder. De outro, pecam querendo nos fazer acreditar que quem está com fome carece de qualidades para o exercício da representação política. A rainha do rock, debochada, irreverente e crítica, a quem todos admiramos, dessa vez pisou na bola. Feio.

- “Venenosa! Êh êh êh êh êh! / Erva venenosa, êh êh êh êh êh! / É pior do que cobra cascavel / o seu veneno é cruel.../.Deus do céu! / Como ela é maldosa!”. Nenhum dos dois – nem Caetano, nem Rita - têm tutano para entender esse Brasil profundo que os silvas representam.

A senadora Marina da Silva tem mesmo cara de quem está com fome? Ou se trata de um preconceito de roqueira paulista, que só vê desnutrição ali onde nós vemos uma beleza frágil e sofrida de Frida Kahlo, com seu cabelo amarrado em um coque, seus vestidos longos e seu inevitável xale? Talvez Rita Lee tenha razão em ver fome na cara de Marina, mas se trata de uma fome plural, cuja geografia precisa ser delineada. Se for fome, é fome de quê?

O mapa da fome

A primeira fome de Marina é, efetivamente, fome de comida, fome que roeu sua infância de menina seringueira, quando comeu a macaxeira que o capiroto ralou. Traz em seu rosto as marcas da pobreza, de uma fome crônica que nasceu com ela na colocação de Breu Velho, dentro do Seringal Bagaço, no Acre. Órfã da mãe ainda menina, acordava de madrugada, andava quilômetros para cortar seringa, fazia roça, remava, carregava água, pescava e até caçava. Três de seus irmãos não agüentaram e acabaram aumentando o alto índice de mortalidade infantil.

Com seus 53 quilos atuais, a segunda fome de Marina é dos alimentos que, mesmo agora, com salário de senadora, não pode usufruir: carne vermelha, frutos do mar, lactose, condimentos e uma longa lista de uma rigorosa dieta prescrita pelos médicos, em razão de doenças contraídas quando cortava seringa no meio da floresta. Aos seis anos, ela teve o sangue contaminado por mercúrio. Contraiu cinco malárias, três hepatites e uma leishmaniose.

A fome de conhecimentos é a terceira fome de Marina. Não havia escolas no seringal. Ela adquiriu os saberes da floresta através da experiência e do mundo mágico da oralidade. Quando contraiu hepatite, aos 16 anos, foi para a cidade em busca de tratamento médico e aí mitigou o apetite por novos saberes nas aulas do Mobral e no curso de Educação Integrada, onde aprendeu a ler e escrever. Fez os supletivos de 1º e 2º graus e depois o vestibular para o Curso de História da Universidade Federal do Acre, trabalhando como empregada doméstica, lavando roupa, cozinhando, faxinando.

Fome e sede de justiça: essa é sua quarta fome. Para saciá-la, militou nas Comunidades Eclesiais de Base, na associação de moradores de seu bairro, no movimento estudantil e sindical. Junto com Chico Mendes, fundou a CUT no Acre e depois ajudou a construir o PT. Exerceu dois mandatos de vereadora em Rio Branco, quando devolveu o dinheiro das mordomias legais, mas escandalosas, forçando os demais vereadores a fazerem o mesmo. Elegeu-se deputada estadual e depois senadora, também por dois mandatos, defendendo os índios, os trabalhadores rurais e os povos da floresta.

Quem viveu da floresta, não quer que a floresta morra. A cidadania ambiental faz parte da sua quinta fome. Ministra do Meio Ambiente, ela criou o Serviço Florestal Brasileiro e o Fundo de Desenvolvimento para gerir as florestas e estimular o manejo florestal. Combateu, através do IBAMA, as atividades predatórias. Reduziu, em três anos, o desmatamento da Amazônia de 57%, com a apreensão de um milhão de metros cúbicos de madeira, prisão de mais 700 criminosos ambientais, desmonte de mais de 1500 empresas ilegais e inibição de 37 mil propriedades de grilagem.

Tudo vira bosta

Esse é o retrato das fomes de Marina da Silva que – na voz de Rita Lee - a descredencia para o exercício da presidência da República porque, no frigir dos ovos, “o ovo frito, o caviar e o cozido / a buchada e o cabrito / o cinzento e o colorido / a ditadura e o oprimido / o prometido e não cumprido / e o programa do partido:/ tudo vira bosta”.

Lendo a declaração da roqueira, é o caso de devolver-lhe a letra de outra música - ‘Se Manca’ - dizendo a ela: “Nem sou Lacan / pra te botar no divã / e ouvir sua merda / Se manca, neném! / Gente mala a gente trata com desdém / Se manca, neném / Não vem se achando bacana / você é babaca”.

Rita Lee é babaca? Claro que não, mas certamente cometeu uma babaquice. Numa de suas músicas - ‘Você vem’ - ela faz autocrítica antecipada, confessando: “Não entendo de política / Juro que o Brasil não é mais chanchada / Você vem....e faz piada”. Como ela é mutante, esperamos que faça um gesto grandioso, um pedido de desculpas dirigido ao povo brasileiro, cantando: “Desculpe o auê / Eu não queria magoar você”.

A mesma bala do preconceito disparada contra Marina atingiu também a ministra Dilma Rousseff, em quem Rita Lee também não vota porque, “ela tem cara de professora de matemática e mete medo”. Ah, Rita Lee conseguiu o milagre de tornar a ministra Dilma menos antipática! Não usaria essa imagem, se tivesse aprendido elevar uma fração a uma potência, em Manaus, com a professora Mercedes Ponce de Leão, tão fofinha, ou com a nega Nathércia Menezes, tão altaneira.

Deixa ver se eu entendi direito: Marina não serve porque tem cara de fome. Dilma, porque mete mais medo que um exército de logaritmos, catetos, hipotenusas, senos e co-senos. Serra, todos nós sabemos, tem cara de vampiro. Sobra quem?

Se for para votar em quem tem cara de quem comeu (e gostou), vamos ressuscitar, então, Paulo Salim Maluf ou Collor de Mello, que exalam saúde por todos os dentes. Ou o Sarney, untuoso, com sua cara de ratazana bigoduda. Por que não chamar o José Roberto Arruda, dono de um apetite voraz e de cuecões multi-bolsos? Como diriam os franceses, “il péte de santé”. O banqueiro Daniel Dantas, bem escanhoado e já desalgemado, tem cara de quem se alimenta bem. Essa é a elite bem nutrida do Brasil.

Rita Lee não se enganou: Marina tem a cara de fome do Brasil, mas isso não é motivo para deixar de votar nela, porque essa é também a cara da resistência, da luta da inteligência contra a brutalidade, do milagre da sobrevivência, o que lhe dá autoridade e a credencia para o exercício de liderança em nosso país.

Marina Silva, a cara da fome? Esse é um argumento convincente para votar nela. Se eu tinha alguma dúvida, Rita Lee me convenceu definitivamente.

P.S. – Uma leitora cricri, mas competente, que está fazendo doutorado em São Paulo (e a tese, quando é que sai?) me lembra que a FAPEAM e a Secretaria de Ciência e Tecnologia do Amazonas constituem o lado sério da atual política estadual, responsável, em 2007, pela primeira lei de mudanças climáticas no Brasil.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Recebido por email!


Nem tudo o que se recebe por email é sobre política ;)
hahahaha
Como eu já percebi que só vou escrever algo além da minha monografia quando já for uma anciã experiente, vou postar isso aqui só pra tirar um pouco as teias desse blog.
Se estiver com vontade de ler algo leve, não é de minha autoria - mas é gostosa a sensação ao fim da leitura.

Uma história curta sobre fazer o bem, sem medir esforços e "sem olhar a quem". Poderia ser um filme, que assistiríamos e sairíamos aliviados do cinema ou da frente da tela. Mas é uma mini-leitura apenas. Como um conto, ou crônica.
Ontem estive conversando com a minha colega de apartamento (a Grazi) sobre religião, Deus, sentido da vida. Fazer o bem pode ser um bom sentido para qualquer vida. Gentileza só gera gentileza. Ser bom mesmo quando tudo parece estar conspirando contra, pode mudar vidas.
Cada um sabe quando se depara com uma situação em que pode escolher entre ser gentil, "fazer o bem com um pequeno gesto" ou apenas ignorar o que está acontecendo, na vida real, no filme em que você é o protagonista.

Todas as pessoas estão passando por algum tipo de luta (li isso várias vezes e em vários lugares nos últimos tempos). É verdade, você, e todos à sua volta. Seja mais gentil do que o necessário, com as que cruzarem teu caminho. Não é tão difícil, e faz bem pra você também.

agora voltando ao trabalho,

ah, eis aqui o texto:

"Em agosto de 2001, Moshê (nome fictício), um bem-sucedido empresário judeu de Nova York, viajou para Israel a negócios.
Na quinta feira, dia nove, entre uma reunião e outra, ele aproveitou para fazer um lanche rápido na pizzaria da esquina das ruas Yafo e Mêlech George, no centro de Jerusalém.

O estabelecimento estava superlotado. Logo ao entrar na pizzaria, Moshê percebeu que teria de esperar muito tempo numa enorme fila, caso realmente desejasse comer alguma coisa - mas ele não dispunha de tanto tempo. Indeciso e impaciente, pôs-se a ziguezaguear por perto do balcão de pedidos, esperando que alguma solução caísse do céu.
Percebendo a angústia do estrangeiro, um israelense perguntou-lhe se ele aceitaria entrar na fila à sua frente. Mais do que agradecido, Moshê aceitou. Fez seu pedido, comeu rapidamente e saiu em direção à sua próxima reunião.

Menos de dois minutos após ter saído, ele ouviu um estrondo aterrorizador. Assustado, perguntou a um rapaz que vinha pelo mesmo caminho que ele acabara de percorrer, o que acontecera. O jovem disse que um homem-bomba acabara de detonar uma bomba na pizzaria Sbarro`s.

Moshê ficou branco. Por apenas dois minutos ele escapara do atentado. De imediato, lembrou do israelense que lhe oferecera o lugar na fila. Certamente ele ainda estaria na pizzaria.
Aquele sujeito salvara a sua vida e agora poderia estar morto.
Atemorizado, correu para o local do atentado para verificar se aquele homem necessitava de ajuda. Mas encontrou uma situação caótica no local.

A Jihad Islâmica enchera a bomba do suicida com milhares de pregos para aumentar seu poder destrutivo. Além do terrorista, de vinte e três anos, outras dezoito pessoas morreram, seis eram crianças. Cerca de outras noventa pessoas ficaram feridas, algumas em condições críticas.

As cadeiras do restaurante estavam espalhadas pela calçada. Pessoas gritavam e acotovelavam-se na rua, algumas em pânico, outras tentando ajudar de alguma forma.
Entre feridos e mortos estendidos pelo chão, vítimas ensangüentadas eram socorridas por policiais e voluntários. Uma mulher com um bebê coberto de sangue implorava por ajuda. Um dispositivo adicional já estava sendo desmontado pelo exército.
Moshê procurou seu "salvador" entre as sirenes sem fim, mas não conseguiu encontrá-lo. Ele decidiu que tentaria de todas as formas saber o que acontecera com o israelense que lhe salvara a vida. Moshê estava vivo por causa dele.
Precisava saber o que acontecera, se ele precisava de alguma ajuda e, acima de tudo, agradecer-lhe por sua vida.

O senso de gratidão fez com que esquecesse da importante reunião que o aguardava. E começou a percorrer os hospitais da região, para onde tinham sido levados os feridos no atentado. Finalmente, encontrou o israelense num leito de um dos hospitais, muito ferido, mas não corria risco de vida.

Moshê conversou com o filho dele, que já estava acompanhando seu pai e contou tudo o que acontecera. Disse que faria tudo que fosse preciso por ele. Que estava extremamente grato àquele homem e que lhe devia sua vida. Depois de alguns momentos, Moshê se despediu do rapaz e deixou seu cartão, para caso o pai necessitasse de ajuda. Que a família não hesitasse em comunicá-lo. Quase um mês depois, Moshê recebeu um telefonema em seu escritório em Nova Iorque daquele rapaz, contando que seu pai precisava de uma operação de emergência. Segundo especialistas, o melhor hospital para fazer aquela delicada cirurgia fica em Boston, Massachussets.
Moshê não hesitou. Arrumou tudo para que a cirurgia fosse realizada dentro de poucos dias. E fez questão de ir pessoalmente receber e acompanhar o amigo em Boston, que fica a uma hora de avião de Nova Iorque.
Talvez outra pessoa não tivesse se esforçado tanto apenas pelo senso de gratidão. Outra pessoa poderia ter dito "Afinal, ele não teve intenção de salvar a minha vida: apenas me ofereceu um lugar na fila ." Mas, não Moshê. Ele se sentia profundamente grato, mesmo um mês após o atentado. E ele sabia como retribuir um favor.
Naquela manhã de terça-feira, Moshê foi pessoalmente acompanhar seu amigo - e não foi trabalhar. Sendo assim, pouco antes das nove horas da manhã,
naquele dia onze de setembro de 2001, Moshê não estava em seu escritório no 101º andar do World Trade Center Twin Towers."